Sunday, September 25, 2022

meu cachorro morreu
e eu não consegui ter paz pra chorar
porque domingo virou dia de trabalho
como todos os outros seis
e se eu chorar não vai ser só pela partida do cão
vai ser pela tristeza de tê-lo perdido antes
por ter sido interditada do convívio
por terem quisto mensurar amor que só eu sei
por ter sido vencida pelo desgaste e desistido
e ficado longe nesse último ano de vida do bicho
não daria tempo de preparar as questões de prova
nem os vários planos de aulas
quando o que eu queria era nem ir 
sumir por um dia
e chorar pelo meu cachorro
esquecer todas as senhas
sentir o sol no corpo
quem sabe me encontrar por baixo
dos cabelos brancos
das olheiras
dessa cara de cansada
desse amontoado de demanda empilhada 
há meses na cadeira da minha cabeça
mas não dá
já são 17h da tarde e logo é segunda
engole o choro pra não enferrujar a lataria
da mulher-máquina que agora escreve poema 
contado em um relógio
sem tempo pro luto
muito menos pra alegria

Sunday, June 19, 2022

Tome nota

Aproximadamente 2603 quilômetros separam o Rio de Janeiro de Fortaleza
Aqui faz frio enquanto você sem camisa coloca um pão no forno pra assar
Reclama que a massa não cresceu, digo que ainda assim vai ficar gostoso
Você rindo diz que adora ser iludido
(Eu também)

- Distância é fermento.

Friday, April 08, 2022

Cisma

 Quis te convidar pra uma despedida, 

quando senti a ausência de corpo presente no seu abraço

Bullet time effect:

vontade vã só atesta um fim já dado

Vivo esses dias sabendo que o tempo não falha

E será certeiro em apaziguar desejo

Mas quando passo de bicicleta 

pela rua dos Inválidos

me flagro olhando pro alto do seu prédio

Pra quem sabe te ver de relance

na varanda

Onde fizemos fumaça

Partilhamos canções

E dançamos quereres

Ai, paixão vizinha,

consolo meu é saber fazer de cisma, poesia

E é preciso virar a página

Friday, January 22, 2021

Do caso de amor entre a árvore e o vento,
bem conhece a sabedoria popular:
"Entorta... enverga, mas não quebra!"
Essa dança resiliente
ensina a ser flexível
Ceder espaço,
conhecendo o próprio limite
Assim, árvore e vento vão pegando o jeito,
o embalo do movimento
É no contato que se aparam arestas
Espalhando por aí as folhas secas
Levando embora o que já não presta
Já as folhas que ficam,
contentes chacoalham
O som que se ouve de festa
É da cosquinha que faz o ar
Soprando carícias
nas frestas da floresta
Ssshhhhhhhhhh!...

Thursday, September 24, 2020

Tuesday, September 15, 2020

Maré cheia

Será que esse mês a gente ainda se encontra
Arrepio de molhar o pé no mar 
pela primeira vez
Os olhos marejam
Dá água na boca
Mergulho salgado
num beijo
Um desejo de ressaca 
de espera
Onda de três metros
Lambe tudo em volta
Lambe tudo aqui
Sereia salivo
Quem sabe a gente mata essa sede de tato
num abraço-remanso
Com sorte não vai ser mais um sonho
de quem não aguenta mais divisa
e quer transbordar oceano